Encontrei-me por primeira vez com com os fotógrafos Juan Alberto Andrade e Cuqui Rodríguez do JAG Studio a um par de anos no Equador. Nosso encontro se deu após a sua palestra na VI edição do Evento Acadêmico da Escola de Arquitetura EARQ da Pontifícia Universidade Católica do Ecuador Sede Ibarra (PUCE-SI). Este jovem casal de fotógrafos se dedica a documentar e divulgar a produção arquitetônica equatoriana contemporânea através de sua arte. Focando nas mais recentes obras inauguradas no país, fotografando o concreto ainda fresco de algumas das mais reconhecidas obras de arquitetura contemporânea equatoriana—produzidas por escritórios como AL BORDE, Daniel Moreno Flores, Natura Futura, Rama Estudio, entre outros—, Andrade e Rodríguez se tornaram de certa forma uma espécie de embaixadores da arquitetura equatoriana no mundo todo.
Por ocasião do Dia Mundial da Fotografia, decidi encontrá-los novamente para saber mais sobre o início de suas carreiras como fotógrafos e seus processos de trabalho, além é claro, de uma inspiradora conversa sobre o papel do fotógrafo na arquitetura contemporânea.
Fabián Dejtiar: Como e quando vocês decidiram fotografar arquitetura?
JAG Studio: Começamos a nossa carreira de fotógrafos de arquitetura quando recebemos uma encomenda quase que por acidente. Não foi algo planejado e tampouco isso significa que estávamos preparados para assumir esta responsabilidade. Acreditamos na naturalidade das coisas, e de fato, nossa passagem para a fotografia de arquitetura de seu de forma muito orgânica, exatamente com essa primeira encomenda no ano de 2013.
Um ano antes, enquanto eu (Juan Alberto) ainda era um estudante de arquitetura na UEES em Guayaquil, a câmera fotográfica que eu havia herdado de meus pais estava cheia de pó e guardada bem no fundo da minha gaveta. Ao longo dos meus últimos anos de faculdade porém, quando você começa a entender que tipo de arquiteto quer ser, e sobretudo, a questionar uma série de coisas, aquela velha câmera foi a ferramenta que eu encontrei para me expressar, explorar a cidade e descobrir o que a arquitetura significava para mim. Foi neste momento que, como arquiteto, eu descobri a fotografia como uma ferramenta de trabalho.
- Casa das camas voadoras / AL BORDE
- Casa Lasso / RAMA estudio
- Casa das telhas voadoras / Daniel Moreno Flores
- Casa Don Juan / Emilio López Arquitecto
Junto com a minha parceira Cuqui, que neste momento ainda estudava medicina, percorríamos a cidade de Guayaquil em busca de edifícios, praças e espaços públicos para fotografar, algo que, por uma série de motivos absurdos, era proibido de se fazer.
Quase dois anos depois o nosso mundo virou de cabeça para baixo: Cuqui decidiu largar a medicina e embarcar em um curso de comunicação audiovisual, e eu, comecei a encarar o fato de que eu queria ser um fotógrafo de arquitetura. Parecíamos duas crianças sonhadoras com o mundo todo a ser explorado.
FD: De onde veio a inspiração para trilhar este caminho?
JAG: Falar de inspiração é algo muito adequado para contar esta história, um percurso que eu tentarei resumir cronologicamente. Primeiro, devemos falar das nossas inspirações e referências, das pessoas que admiramos e que nos incentivaram a seguir em frente. No meu caso em particular, o exemplo que eu gostaria de citar é Jesús Granada, uma pessoa que eu tive o prazer de conhecer e que me ajudou muito no começo, e também a Julius Shulman. De fato, até o convidamos para o nosso casamento.
Ao longo do caminho fomos encontrando novas inspirações para nossos projetos, tanto em nossas caminhadas exploratórias quanto no próprio cenário da arquitetura contemporânea equatoriana. Descobrindo novos edifícios e cidades, interagindo com seus habitantes e conversando com nossos colegas, tudo isso foi muito importante para estabelecer o nosso escritório. E mais do que isso, a maneira como nos apropriamos da fotografia como uma ferramenta para a divulgação e promoção da arquitetura contemporânea equatoriana em um cenário mais amplo.
Finalmente, encontramos inspiração também em nossos próprios esforços. A capacidade de ressignificar o nosso trabalho dia após dia, é algo que tem muito a ver com a nossa própria personalidade, e é disso que a gente vive.
FD: Eu sei que vocês tratam a fotografia de arquitetura com muita seriedade e profissionalismo, vocês diriam que a fotografia é também uma forma de se ‘fazer’ arquitetura?
JAG: Sim, sem dúvida. No entanto, ainda no início eu estava tentando me convencer de que fotografar era também uma forma de se fazer arquitetura. Mas com o tempo, percebemos as muitas similaridades entre a fotografia de arquitetura e a própria arquitetura. Nosso trabalho se fundamenta em dois elementos principais: o usuário e a luz. A partir daí, vamos nos confrontando com as várias camadas de informação (de contextos a conceitos) e assim buscamos dar forma ao que chamamos de um projeto fotográfico de arquitetura.
Nossos processos de trabalho são muito claros e nascem da premissa de sintetizar em um só quadro uma série de elementos. Em primeiro lugar, concentrando duas verdades não absolutas sobre o projeto retratado: a nossa visão sobre o edifício e o ponto de vista do arquiteto responsável pela obra, o qual vem acompanhada de todos os seus processos, sucessos e frustrações. E aí que começa o nosso trabalho, com o engajamento com a matéria da arquitetura.
FD: Como vocês lidam com a temporalidade das obras nesse sentido, com base na urgência que a disciplina nos exige hoje?
JAG: Em primeiro lugar, devemos começar definindo o objetivo por trás da nossa prática, que do nosso ponto de vista é promover e divulgar a prática da arquitetura contemporânea equatoriana, uma missão que não nos foi dada, mas que está implícita na forma como retratamos estes edifícios. Através da fotografia, queremos apresentar para o mundo o trabalho dos nossos colegas, construindo uma espécie de declaração que também tem a ver com a própria representação da arquitetura. Obviamente a fotografia não é a única forma de retratar a arquitetura, talvez nem seja a melhor forma de se fazê-lo, mas sem dúvida é através da fotografia que estamos deixando também a nossa marca no mundo.
Dito isso, para chegar onde chegamos foi preciso ‘regredir’ de alguma forma, desfazer-se da ideia de estabelecer um escritório físico e assumir um caráter mais nômade, exploratório. Neste sentido, o escritório somos nós dois, levamos ele conosco aonde quer que estivermos.
Em termos de logística, isso nos demanda muito esforço e cuidado, inclusive em nossos momentos de descanso, como durante uma conversa no café da manhã. Nosso trabalho se tornou um estilo de vida. Hoje acordamos frente ao mar, e amanhã provavelmente estaremos a 4800 metros acima do nível do mar, fotografando uma cabana junto ao Vulcão Chimborazo. Encontramos no caráter multidisciplinar de nosso escritório o nosso refúgio, aprendemos a confiar um no outro e nas capacidades complementares que temos, onde cada um faz o seu melhor em prol de um objetivo comum.
FD: Em relação às novas tendências, qual é papel do fotógrafo de arquitetura? Uma vez que hoje em dia todos nós somos um pouco responsáveis por registrar e divulgar o nosso trabalho?
JAG: O trabalho do fotógrafo de arquitetura evoluiu muito ao longo dos últimos anos, assumindo uma série de novas responsabilidades e fazendo uma série de novos inimigos (risos). O papel da fotografia de arquitetura hoje é muito relevante (as vezes até mais que a própria obra), ela faz com que um projeto chegue a mais pessoas, muito além daqueles que podem visitá-la pessoalmente. Em nosso caso, por exemplo, passamos meses trabalhando em um projeto fotográfico para poder sintetizar todas as nossas intenções como escritório de fotografia de arquitetura quando documentamos um determinado projeto ou espaço construído.
- Casa El Camarote / Sebastián Calero Larrea
- Grande Cabana DLPM / Juan Carlos Bamba, Ignacio de Teresa, Alejandro González
Através da fotografia estamos construindo uma espécie de plataforma, um ponto de vista bastante pessoal sobre a arquitetura equatoriana. Encaramos nosso trabalho como um ‘mapeamento da arquitetura nacional’, um catálogo de relatos fotográficos que apresentamos ao mundo através desta plataforma, complementando as imagens com o material gráfico fornecido pelos próprios arquitetos. Para nós a fotografia tem um poder de síntese, muito por que a representação fotográfica tem uma certa profundidade que vai muito além do mero desenho, sempre que acompanhada de uma profunda reflexão sobre aquilo que estamos fazendo.